Adaptação do Mangá homônimo da Autoria de Kyoko Okasaki
Japão
Cor
127 min.
Romaji: Heruta Sukeruta
Japanese: ヘルタースケルター
Direção: Mika Ninagawa
Adaptação & Roteiro: Arisa Kaneko
Produtores: Mitsuru Uda r Morio Amagi
Elenco: Erika Sawajiri (Lilico), Nao Omori (Makoto Asada), Shinobu Terajima (Michiko Hata), Go Ayano (Shin Okumura), Kiko Mizuhara (Kozue Yoshikawa), Hirofumi Arai (Kinji Sawanabe), Anne Suzuki (Kumi Hosuda), Susumu Terajima (Keita Tsukahara), Kaori Momoi (Hiroko Tada), Sho Aikawa (Mikio Hamaguchi), Mieko Harada (Hisako Wachi) e Yosuke Kubozuka (Takao Nanbu)
Cinematografia: Daisuke Soma
Data de lançamento: 14 de julho de 2012
Distribuidora: Asmik Ace Entertainment
Idioma: Japonês
Sinopse:
A estrela Lilico passa por várias cirurgias estéticas em todo o corpo. Como suas cirurgias mostram efeitos colaterais, Lilico torna a vida das pessoas ao seu redor um verdadeiro inferno enquanto tenta lidar com sua carreira e seus problemas pessoais.
⚖️Créditos da Sinopse: Cine Asian Space
Inomináveis Saudações a todas e todos vós, Seres Do Mundo!
Existem, tradicionalmente, várias formas de Adaptação de uma obra nascida em uma Mídia para outra, as quais, muitas das vezes, reforçam a ideia da história original. Porém, algumas Adaptações perdem o tom do material base por completo e se afogam distantes das margens do que foi naquele apresentado. Este último panorama não é, felizmente, o caso desta primorosíssima artística concepção adaptativa do Mangá de Helter Skelter, uma elaboração de algo que, além de reforçar a ideia original, adicionou mais camadas ao naturalmente complexo Mangá Gekigá escrito e ilustrado por Kyoko Okasaki. Tudo neste filme tem na Diretora, Mika Ninagawa, o ponto de poderosa confluência de fatores habilmente escolhidos para que este se tornasse um exemplo máximo de como transposições de enredos, situações, cenários e diálogos de um Universo Mitológico Ilustrado para um Universo Mitológico Cinematográfico.
O Universo de Helter Skelter já foi anteriormente explorado, devasado e analisado, sem spoilers, na Resenha do Mangá aqui no blog. Apoiando-se em todas as estruturas do mesmo, Ninagawa ousou dar uma nova linguagem aos Personagens de carne, ossos, músculos, sentimentos e silêncios. A Estética e a Fotografia do filme são de encantar a tal ponto que, por alguns momentos, me encontrei como a assistir uma exposição de arte em delirante movimento. É tudo um grande delírio aqui, um estético delírio de cores, sorrisos, risos, sexo, solidão, perdição e deterioração desde o primeiro momento. Imprimindo honestidade e autenticidade a um Universo tão distópico quanto o da Moda e das Celebridades, a Diretora e a Roteirista Arisa Kaneko usaram muitas vezes da Música como mensageira dos vazios e preenchimentos e buscas destes ao longo de cada passagem-chave da trama. Com tudo explodindo ao mesmo tempo dentro deste delírio beirando o delito e seduzindo a subversão com doses altas de tensões sexuais, tudo quase poderia ter sido arruinado. Mas, quando se nota que o enredo possa decair e se autodestruir, a presença sutil da Diretora, sem interferir diretamente no desenrolar das coisas a serem objetos e sujeitos de certas ações, se mostra a mais leve equilibradora de tudo.
E muito do notável equilíbrio deste alucinado, imprevisível, questionador, perturbador e insano filme se deve à monstruosa atuação maravilhosa de Erika Sawajiri. A Lilico do Mangá transposta com exímia fidelidade e vigor por uma Grande Atriz abunda fortemente diante do olhar do espectador. Sendo uma linda mulher, o que inegavelmente não posso deixar de comentar aqui, Sawajiri incorporou muito mais do que a Personagem Original posta em movimento por Okasaki determinou para si. É muito incomum uma Atriz modelar uma Personagem com as variáveis e as invariáveis de comportamento, personalidade e existência em um tom surreal, onírico e de completo êxtase. Toda a vaidade, manipulação, ardilosidade, frieza, crueldade, arrogância, esnobismo, vontade de eternizar-se e o desejo de estar sempre por cima de Lilico encontrou uma intérprete ideal, sendo dificílimo para uma Atriz no futuro, caso façam uma outra Adaptação, encarnar o Papel. Dentro de todas as obscuras faces de Lilico, no entanto, Sawajiri manejou um tom conforme o desequilíbrio e a instabilidade da Personagem mostrando as diversas mais frágeis camadas da mesma quando os holofotes, câmeras e Repórteres estão distantes.
Consigo mesma, mais do que visto no Mangá, Lilico é exposta em toda a nudez de sua psicológica ruína e o que há para ser notado se encontra no quanto Sawajiri leva a brilhantes patamares toda a dramática carga de fissuras na vida daquela. Uma vida mesmo pode ser chamada a de alguém que, exclusivamente, só pensa na Fama, em querer ser adorada como uma Deusa e amada por multidões de Fãs pelo mundo? Uma vida mesmo pode ser chamada a de alguém que depende somente da aprovação de quem a admira para poder sentir-se verdadeiramente a respirar? Uma vida mesmo pode ser chamada a de alguém que faz de tudo para nunca perder o trono que ocupa, mesmo destruindo quem a cerca e autodestruindo-se por consequência? Kozue Yoshikawa, o oposto de Lilico no Mangá e dentro da interpretação de Kiko Mizuhara no filme, dá a única resposta às três perguntas que fiz neste parágrafo. Prestem muita atenção ao que ela diz em uma cena primordial do filme, algo que se aplica ao que muitos ou quase todos os envolvidos com os Famosos e Célebres talvez nunca tenha parado para pensar. Palavras que desconstroem o que se centraliza acerca do que se pensa das pessoas belas por natureza (como Yoshikawa) ou tornadas belas a partir de intervenções estéticas perigosamente intrusivas (o caso da Lilico).
Usando e sendo usada, Lilico é a mais perfeita das críticas às distopias que buscam “o corpo perfeito”, “a maior das belezas” e “a melhor das vidas possíveis quando se tem Fama, Dinheiro e Poder”. O Poder de Lilico, artificial e inconstante por ser temporário (como é o Poder de todas as Modelos tanto no Japão quanto aqui no Brasil e em todos os outros países deste mundo) se concentra em dominar O Tempo a fim de tornar lento o sucessivo movimento do relógio. Em uma carreira como a dela, é O Tempo que determina a validade e a qualidade de uma Modelo, o que ela não aceita, diferente do que pensa a “sucessora” dela junto ao público consumidor dos trabalhos fotográficos que protagoniza, Yoshikawa. A Guilhotina Temporal fica bem localizada dentro do desenvolvimento narrativo e muito angustiante é presenciar o desespero e a decadência existencial de Lilico quando ela começa a perceber que as horas dela junto aos corações dos adoradores e adoradoras irão desfazer-se. A sensação que a Direção do filme dá é a de um tic-tac sendo ouvido acima de toda a loucura, glamour e vazio que envolve a saga de Lilico a priori e a posteriori quando o filme começa. Quando este termina, resta apenas a nós, como espectadores sobreviventes de tudo o que foi nele visto, compormos de forma imaginativa o quanto que restou de tudo o que vimos durante duas horas.
Tendo sido pego de imensa surpresa por não saber da excelência desta Adaptação, me senti no meio de um Terror e de um Horror estéticos genuínos por obra e graça da narração do todo nas linhas e entrelinhas da história. Vejo Terror na louca busca de atenção, de likes, de elogios e de dinheiro a partir da Fama. Vejo Horror na patética ansiedade por multiplicar bilhões de vezes a própria Fama para ser muito mais amada em uma eterna disputa consigo mesmo, com “rivais” e “inimigos(as)”, estes dois últimos “grupos”sendo do Terrestre Olimpo Das Celebridades. Esta minha visão se elevou e cresceu ainda mais com o contato que tive com Helter Skelter, obra-prima em Mangá e Filme, sendo este, insisto, um extremo acréscimo ao que é lido naquele. Adaptação com vida e caráter próprios, as qualidades nele são atemporais desafiando a contagem temporal. Porque enquanto existirem as Celebridades, as mensagens que a senhora Okazaki transmitiu no original se constroem como permanentes desafios a reflexões sobre as inevitáveis e evitáveis marés dos oceanos daquelas. O que me faz indagar ao final desta Resenha, assim como fiz com a do Mangá:
É melhor esquecer ou quebrar o relógio que, incessante e invencível, corre em ultravelocidade a anunciar todos os términos, rompimentos e enterros?
Saudações Inomináveis a todas e todos vós, Seres Do Mundo!
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Mika Ninagawa