Dentro dos limites das cinzas urbanas, cada um ouve uma música conforme o brado de seus passos na estrada existencial desta Civilização estrangulada. Muita gente ouve uma música de amor enquanto bombas ceifam milhares do outro lado das fronteiras de seu país. Muita gente ouve uma música de ódio enquanto a pureza de raros habitantes terrestres ainda desafia os extremismos e fundamentalismos ora vigentes no contemporâneo estado mundial de coisas. Muita gente nada ouve. Muita gente pouco ouve.
Dentro das mentiras das cinzas urbanas, as músicas tocadas atingem volumes e harmonias que esgotam e fortalecem as humanas caminhantes marchas. Muita gente ouve uma música de desespero enquanto esperançosos humildes erguem suas mãos em auxílio a diversos tipos de necessitados. Muita gente ouve uma música de desapego enquanto viciados apenas no material enredo diário se preocupam unicamente com o próprio Ego hipertrofiado. Muita gente julga ouvir muita coisa. Muita gente alega ouvir pouca coisa.
Dentro das verdades das cinzas, as músicas expandidas pelas ruas decapitantes e decrépitas cingem o asfalto com retalhos de tempos outrora sumariamente grandiosos. Muita gente ouve uma música de alento enquanto um inaudível pranto se transforma em oceano de dor dentro de um escuro quarto. Muita gente ouve uma música de angústia enquanto a soberania de um sorriso sacode as internas estruturas daqueles que, mesmo após a mais densa furiosa tempestade, continuam a dar passos pelo cinzento mundo. Muitos estão com os ouvidos aturdidos sem nada poder ouvir. Muitos desejam nada ouvir.
Dentro das vilanias das cinzas, as músicas se repetem em uma sinfonia sucessiva de retornos e entornos insistentes em seu poder como necessárias. Muita gente ouve uma música de viscerais valores de ideais enquanto a ignorância e os preconceitos grassam incólumes por recantos envenenados pelo atraso. Muita gente ouve uma música de revolta da mais justificável natureza enquanto injustificáveis injustiças rompem as barreiras das realidades devido aos seus escandalosos absurdos. Muitos querem ouvir sons diferentes. Muitos desprezam qualquer sonoridade.
Dentro dos heroísmos das cinzas, a forma das forças de toda música calam as mais altas vozes nascidas da estupidez que agora tem vez dentro da cinzenta sociedade como uma norma do viver para alguns. Muita gente ouve uma música de perdas enquanto vitórias esmagadoras arrancam gargalhadas e sorrisos e felizes lágrimas em redor do humano orbe. Muita gente ouve uma música de segurança enquanto sucessivas inseguranças de todos os estilos e origens forjam uma egrégora de desagradáveis mensagens para toda a Humanidade. Muitos fogem de algo para ouvir. Muitos se escondem para não ter algo a ser ouvido.
Dentro do vazio das cinzas, cada música tem um latente e potente significado no esoterismo profiláctico de seu poder como raízes de árvores sustentadoras do urbano cais. Muita gente ouve uma música de medo enquanto enfrentar o perigo de simplesmente sobreviver na Terra move multidões guerreiras no campo de batalha do existir do agora. Muita gente ouve uma música de poder enquanto a fraqueza maximiza a torpeza de hordas voltadas apenas para a rapinagem mais grosseira. Muitos ouvem somente algo bem baixo. Muitos ouvem somente algo inacreditável.
Dentro do preenchimento das cinzas, as músicas ocupam horizontes já preenchidos como invasoras tentando repassar suas nítidas mensagens de quebras de expectativas nas almas ainda inocentes que se sentem imunes ao cinzento enredo da História. Muita gente ouve uma música febril enquanto a saúde d'alma de grupos voltados para o otimismo do viver se torna a saga encontrada por quem sonha em fazer das cinzas sólidas eternas ricas rochas. Muita gente ouve uma música de despertar enquanto o adormecer de vontades e desejos leva ao recrudescer das cinzentas montanhas de involução ativas por toda parte habitada da Cinzenta Cidade. Muitos querem ouvir. Muitos fingem ouvir.
Eu ouço o que não quero ouvir.
O que você ouve, cinzenta irmã humana?
O que você ouve, cinzento irmão humano?
Inominável Ser
CINZENTO
CRONISTA
INOMINÁVEL
Acompanhem aqui todas as Cinzentas Crônicas: